Vindo de uma família espanhola ligada às artes, Eduardo Manzano era um garoto que aos nove de idade já sonhava em ser um estilista automobilístico, um “carrozieri”, como Bertone, Pininfarina ou Giugiaro. Depois de dois cursos de desenho técnico, um no Senai e outro no Instituto Nobel de Tecnologia ele se empolgou e foi ver o que era necessário para ser um designer de carrocerias, como se falava na época.
Descobriu que havia duas maneiras em nível de graduação em São Paulo, uma, através do curso de Engenharia Mecânica da FEI e outro, em uma Faculdade de Arquitetura Belas Artes de São Paulo, onde ele optou. E aos poucos entendeu que os desafios da arquitetura eram muito mais realistas e viáveis do que os projetos de carrocerias. O Brasil ainda não tinha uma tradição neste segmento e o pragmatismo falou mais alto.
Após trabalhar em grandes escritórios internacionais de arquitetura, Manzano criou seu próprio escritório de arquitetura e hoje a EMDAStudio tem mais de 200 projetos ligados de alguma forma ao turismo e a hospitalidade. No momento seu escritório possui 16 projetos em andamento, perfazendo um total de cerca de 2.500 chaves, entre multipropriedade e hotelaria. E Manzano enxerga um bom momento na hotelaria para crescer e consolidar ainda mais. Confira nessa entrevista exclusiva.
Revista Hotéis - Como foi que você entrou no segmento da arquitetura? Foi uma vocação ou uma oportunidade encontrada para trabalhar?
Eduardo Manzano - A minha entrada na arquitetura veio de uma maneira um pouco diferente dos demais profissionais. O meu grande desejo era ser estilista automobilístico, um “carrozieri”, como Bertone, Pininfarina ou Giugiaro. Embora venha de uma família espanhola ligada às artes deste sempre, fazer este link da arte com a engenharia sempre foi o meu sonho. Meu primeiro curso de desenho artístico foi aos nove anos de idade. Depois, dois cursos de Desenho Técnico, um no Senai e outro no Instituto Nobel de Tecnologia e aí, me empolguei e fui ver o que era necessário para ser um “designer de carrocerias”, como se falava na época. Descobri que havia 2 maneiras em nível de graduação em São Paulo: Uma, através do curso de Engenharia Mecânica da FEI e outro, em uma Faculdade de Arquitetura, onde conseguiria aliar a forma e a função de uma maneira mais lúdica.
Optei pela segunda, a Faculdade de Belas Artes de São Paulo, que na época ocupava a atual Pinacoteca de São Paulo. Aos poucos entendi que os desafios da arquitetura eram muito mais realistas e viáveis do que os projetos de carrocerias. O Brasil ainda não tinha uma tradição neste segmento e o pragmatismo falou mais alto. Jamais me arrependi desta escolha, afinal, o centro da minha paixão sempre foi o “produto” elaborado construído. Daí veio minha obsessão por qualidade e técnica aliadas ao design. Os clientes e fornecedores que os digam...
R.H - Quais cursos fez e como se deu sua formação profissional para se posicionar hoje como uma das referências de escritório de arquitetura hoteleira no Brasil.
E.M - A escolha caiu sobre a Belas Artes, na época, a escola mais disruptiva de arquitetura de São Paulo. Tínhamos os melhores professores, alunos incrivelmente criativos e um espaço de sonhos para poder ter aulas. De nossa geração da Belas Artes podemos destacar o Humberto Campana, entre muitos outros. O passo para a hotelaria também foi inusitado. Meu parceiro de projetos até hoje, Carlos Mauad, era estagiário do grupo comandado por Oscar Niemeyer para a nova sede da prefeitura de São Paulo. Em um dia qualquer, uma ligação telefônica vinda de um fornecedor à secretária do grupo pediu uma indicação de um arquiteto para ver um projeto em Goiás e só o Mauad estava naquele momento no escritório.
O resultado é que no final daquela semana, exatamente uma semana após a festa de formatura, estávamos desembarcando na antiga Pousada do Rio Quente, naquela época em Caldas Novas (o município de Rio Quente ainda não havia se emancipado), e o resto virou história. Estamos falando de 2 de fevereiro de 1987. O cliente acreditou em nosso potencial e chegamos aonde estamos hoje, tendo eles como clientes até hoje e nos tornando uma referência em Parques e Hotéis na América Latina. Em tempo, fizemos 75 projetos para o grupo, em todas as escalas, além de termos elaborado o Plano Diretor do Município.
“Uma semana após a festa de formatura da faculdade, desembarquei na cidade de Rio Quente (GO) para elaborar um grande projeto que me abriu as portas do setor”
R.H - Você foi diretor de escritórios internacionais de arquitetura, como VOA Associates e Perkins+Will. No que essa bagagem profissional mudou seus conceitos e impactou para abrir o EMDAStudio?
E.M - No final dos anos 90, a VOA Associates, que é nada mais nada menos o escritório que fez diversos Master Plans e projetos de hospitalidade para a Disney, fez o Master Plan Estratégico para o Rio Quente.
Em 2003 fui convidado para fazer parte da diretoria do escritório de São Paulo e por lá fiquei 13 anos. Em 2016 assumi a diretoria da Perkins & Will e, por conta da experiência, fui um dos responsáveis globais pelo setor de hospitalidade, ficando até 2017, quando decidi voltar a ter meu próprio estúdio novamente, com o pessoal egresso da VOA e da Perkins & Will, que havia trabalhado comigo. A ideia era criar algo totalmente novo, misturando a eficiência dos grandes escritórios internacionais com a criatividade brasileira e a experiência do ofício no País. Surgiu aí o EMDAStudio. A grande lição desses 15 anos em escritórios internacionais foi a importância do trabalho em equipe, em estruturas multidisciplinares e com uma grande diversidade.
R.H - A arquitetura de hotéis está em constante evolução. Quais as principais diferenças que analisa desde quando iniciou sua carreira até os dias atuais? A padronização ainda é uma realidade? Ou reinventar constantemente a arquitetura se tornou uma necessidade?
E.M - Houve uma época em que só se falava em padronização. Para a época, isto era a melhor solução. Estamos falando das grandes viagens internacionais corporativas e o importante era ter em Singapura o mesmo padrão de Houston. O mobiliário se tornou um item de produção industrial onde o que mandava era o “setup” das máquinas CNC para cortar as chapas de MDF e evitar a menor perda.
Salvo raríssimas exceções, a hotelaria de luxo, principalmente as marcas upscale, passaram pelo mesmo processo. Com a virada dos anos 2.000, um novo componente começou a falar mais alto no design de hotéis. O comportamento das pessoas passou a ser mais hedonista, mais preocupado com moda, com experiências e com histórias para se contar. Os hotéis passaram a se conectar com o local onde ele estava inserido. O Paramount de Nova York, de Philippe Starck, é um dos primeiros neste contexto, mas o contemporâneo W, localizado em Times Square, também em NY se une a esse pioneirismo. Hoje ninguém mais fala em padronização. Só em experiências exclusivas (e inclusivas) como motor de captação de clientes.
R.H - O que te inspira e leva em consideração na hora de desenvolver um projeto hoteleiro? A sustentabilidade é um tema central a ser alcançado?
E.M - O que nos inspira, sempre, é a experiência do hóspede, o retorno que o negócio irá dar ao cliente e a perfeita operação hoteleira. Hotelaria é um negócio. Pensar em sustentabilidade é uma obrigação.
R.H - Quantos projetos arquitetônicos já desenvolveu até hoje? Tem algum em especial que foi mais desafiante e superou suas expectativas?
E.M - Temos hoje mais de 200 projetos ligados de alguma forma ao turismo e a hospitalidade. Incluindo as passagens pelos escritórios internacionais. São projetos muito grandes, chegando a mais de 80.000 m² e 1.100 quartos, às vezes, em uma única unidade. Agora fora da hospitalidade, temos mais de 90 residências projetadas, edifícios residenciais, hospitais, galpões e Shopping Centers.
Neste ano ultrapassamos as 17.000 chaves projetadas, 900.000 m² de área construída e mais de 3.000 hectares em Master Plans. Sem dúvida, a renovação do icônico Hotel Nacional no Rio de Janeiro foi o maior desafio, quando estava à frente da VOA Associates, junto ao sócio Marcos Leite Bastos.
“Temos em nosso portfólio mais de 200 projetos ligados de alguma forma ao turismo e a hospitalidade”
R.H - O EMDAStudio está com bastante foco em projetos arquitetônico voltados à multipropriedade. Desenvolver projetos nesse modelo é mais difícil do que na hotelaria tradicional?
E.M - Ambos têm suas complexidades. A Multipropriedade, geralmente, tem um foco muito forte na “família”. São quartos que podem ir de um casal e um bebê em um berço, a uma casa de 400 m² com cinco suítes. Um grande diferencial é o público e o uso. Junto com o perfeito estudo dos fluxos operacionais, a definição e especificação correta de acabamentos é a chave da sustentabilidade do negócio e a experiência dos hóspedes tem um outro peso. Podemos dizer que as grandes atrações da multipropriedade para a classe C são as áreas de lazer (ou o destino) e de alimentação, sempre farta. Na classe B, novo segmento de mercado, a qualidade das acomodações, produtos e serviços diferenciados se somam às anteriores.
Na arquitetura de hotéis, o contexto passa pela não necessidade de áreas de alimentação dentro dos quartos, quase obrigatórias na modalidade acima, e temos ainda que levar em conta a durabilidade dos materiais, operação de qualidade, alimentação diferenciada e “pay back” de uma maneira diferente do modelo compartilhado.
Além do mais, a Multipropriedade só funciona corretamente quando ligada a um destino, quer seja uma praia (ou montanha) ou um parque aquático (ou qualquer outro componente de entretenimento com escala), portanto, por definição, é uma hospitalidade de lazer ou de foco específico, como o religioso.
R.H - Quantos projetos possui em desenvolvimento no momento (caso queira, pode citar alguns) e como enxerga o atual momento do setor hoteleiro? Voltamos a performance pré-pandemia da COVID e o que esperar nos próximos anos?
E.M - Temos 16 projetos em andamento, perfazendo um total de cerca de 2.500 chaves, entre Multipropriedade e Hotelaria. Podemos destacar atualmente os projetos do Hotel Transamerica Collection, de 700 chaves, junto a Basílica de Aparecida, o Ilhas de Atibaia, com a marca Wyndham, com mais de 500 uhs, O Curupy Resort, em Sinop, entre outros. Para o futuro, estamos com 28 projetos no “pipe line”. Em um contexto geral da hospitalidade, o atual momento é promissor e o país já voltou aos números de 2019, mesmo tendo uma quantidade de hotéis em condições não aceitáveis. O turismo é o maior empregador do mundo e no Brasil está sub explorado. Precisamos de um Ministério de Turismo mais parceiro dos hoteleiros e de quem milita na área.
“Estamos com 28 projetos no pipe line, o atual momento é promissor e já voltamos aos números de 2019”
R.H - Em projetos de redes internacionais é possível sair um pouco dos padrões, ter liberdade para ousar, tropicalizar, ser mais criativo e criar projetos que não impacte os orçamentos?
E.M - Atualmente é muito mais fácil. As redes até exigem um percentual de fornecedores locais para o projeto e design que evoque a brasilidade. Acho que a curva de aprendizado gerada pela demanda desenfreada da época das Olimpíadas e de Copa do Mundo surtiu algum efeito.
R.H - Quais são as tendências da arquitetura hoteleira? E como elaborar um projeto para que não envelheça rapidamente?
E.M - A pandemia nos trouxe muitas lições na hospitalidade. Uma delas, que devo destacar, é a de que o projeto deve deixar de ser feito para nichos específicos. Um “millenial” de 2015 talvez já esteja casado e seja pai, desejando algo mais conservador. A Geração Z, já veio mais conservadora que a Y, o que ajuda o projeto a ser mais perene. Como as atualizações passam a ser mais caras em tempo mais prolongado, o projeto deve refletir um pensamento um pouco mais “pé no chão”. Basta ver as competições internacionais de Design de Hotéis. Vemos uma profusão de projetos em estilo “art decô”, que seriam um verdadeiro sacrilégio há 15 anos atrás.
Outra tendência, que se tornou realidade, foi a questão da tecnologia, cada vez mais presente na operação e na experiência do hóspede, sem contar a chamada “hotelaria híbrida” que, pouco a pouco, tem se tornado a salvação para muitos empreendimentos, outra questão muito importante. Cada vez mais, os profissionais de projeto de hospitalidade devem ser especializados. Tivemos uma “overdose” de arquitetos sem experiência antes da pandemia e que levou as redes hoteleiras e investidores à loucura.
E isto conta desde a correta especificação dos materiais até o completo entendimento de operação, governança e manutenção. A longevidade de um empreendimento passa por aí, pela compreensão do negócio, pela atualização constante do profissional, pela humildade em entender as “dores” do cliente e pelo conhecimento quase obsessivo por produtos e qualidade.
R.H - A arquitetura hoteleira continua atraindo novos talentos? O que esperar da nova geração?
E.M - Depois de muito tempo podemos dizer que a Arquitetura Hoteleira está chegando a sua maturidade. Temos escolas especializadas em projeto para hospitalidade, módulos de arquitetura dentro de cursos de Pós-graduação em Gestão Hoteleira e de Design de Interiores, redes hoteleiras contratando profissionais formados por estas escolas, temos eventos sensacionais como os organizados pela ADIT e Equipotel, palestras, webinars e cursos rápidos em todo o país, hotéis abertos a visitas técnicas e uma grande quantidade de jovens querendo entrar para o setor.
Nosso escritório chegou ao ponto que queríamos, atraindo estes jovens para trabalhar conosco, quase se tornando uma escola sem querer (querendo, como dizia o Chaves). O EMDAStudio conta com três professores de Arquitetura e Gestão Hoteleira em seu corpo e uma quantidade de alunos e ex-alunos em seu time e isto nos faz ter a sensação de que estamos num bom caminho.
Case de sucesso
O Hotel Transamerica Collection projetado por Eduardo Manzano será um grande divisor de águas de hospedagem de qualidade na capital da fé que chegou a receber 9 milhões de turistas em 2024. O empreendimento terá localização privilegiada, pois será implantado à poucos minutos da Basílica de Nossa Senhora Aparecida. Sua localização no alto da montanha proporciona não apenas uma vista panorâmica, mas também acesso fácil aos principais pontos turísticos da região. Este projeto visa criar um espaço que não apenas habite, mas que eleve a qualidade de vida de seus moradores, proporcionando uma vivência única, conectada à natureza e à cultura local. Haverá 700 unidades de alto padrão projetadas com requinte e modernidade, os apartamentos oferecerão uma experiência de hospitalidade incomparável, com acabamentos de qualidade e opções adaptáveis às necessidades de cada hóspede.
[caption id="attachment_167167" align="aligncenter" width="640"] Perspectiva de como será a fachada do Hotel Transamerica Collection, projetado por Eduardo Manzano, que será construído em Aparecida (SP) (Foto - Divulgação)[/caption]
Haverá um parque aquático que será um dos principais atrativos do empreendimento, proporcionando diversão e relaxamento para toda a família, em meio à natureza exuberante. Ainda como opções de lazer, terá amplos espaços incluindo piscina coberta, spa, áreas verdes e playgrounds, que garantirão que os residentes desfrutem de um estilo de vida ativo e social. Na área gastronômica o empreendimento abrigará três restaurantes de alta gastronomia, trazendo uma variedade de sabores e experiências culinárias para satisfazer todos os paladares.
A cobertura contará com um roof top que oferecerá vistas das montanhas e da Basílica de Nossa Senhora Aparecida, ideal para momentos de descontração e encontros sociais. Com a intenção de atender às necessidades da comunidade, o projeto incluirá uma capela e um salão de eventos versátil, prontos para celebrar momentos especiais, como casamentos e confraternizações.